A dança oriental de Fádua Chuffi

Qua, 07/07/2010 - 15:10
Um nome conhecido mundialmente na arte da dança árabe e flamenca, Fádua Chuffi voltou ao Brasil há um ano e meio, após viver três na Espanha, onde atuou como dançarina e professora. Morando desde então em São Paulo, ela vem dando aulas, workshops e cursos mensais, tendo se apresentado, no dia 4 de julho, no Espaço Aman, seu novo show solo de dança oriental. A bailarina está projetando ainda a montagem de dois espetáculos em grupo. “Mas prefiro manter o segredo e surpreender no momento em que tudo estiver pronto para ser apresentado”, diz ela. Em entrevista para o ICArabe, Fádua falou, entre outras coisas, sobre sua descendência árabe, de que forma isso influenciou sua arte, e avaliou o cenário da dança oriental no Brasil.

Quando você nasceu?
21 de fevereiro de 1971.

Seus avós paternos são libaneses. Essa descendência influenciou de alguma maneira sua escolha pela dança oriental?
Acredito que minha descendência libanesa me trouxe sentimento pela música, instrumentos, cantos, interpretações árabes. Me proporcionou ainda respeito pela cultura e amor pela tradição. Do lado da minha mãe, que é italiana, acredito que herdei a paixão presente também nos árabes e espanhóis. Todos têm “sangue quente”. Do Brasil trago algo muito importante que é o ritmo no ouvido e no corpo, além da alegria pela música e pela dança, que é algo natural daqui. 

Qual era o seu contato e sua relação com a cultura árabe em sua casa?
Quando estava perto da adolescência comecei indagar  cada vez mais sobre minhas raízes. Minha relação e interesse pelos meus antepassados tornaram-se algo importantíssimos em minha vida. Meu pai muitas vezes comentava passagens da vida cotidiana dos meus avós, como celebravam as bodas árabes nas reuniões com outras famílias amigas, como dançavam o dabke, como minha avó fazia o pão árabe em casa, etc. Meu pai é o mais velho de cinco irmãos portanto possui muitas recordações que reavivaram e instigaram o sangue árabe em minhas veias. Apesar de ter nascido no Brasil possuo uma forte identificação e orgulho por esta cultura. Meu pai me ensinou algumas palavras soltas em árabe e seus pais falavam somente em árabe. Porém o fato de minha avó, mãe de meu pai (que também chamava-se Fádua) ter falecido quando ele era ainda adolescente, fez com que ele perdesse o contato diário com a língua. Decidi então conhecer a fundo o idioma que fazia parte da vida dos meus antepassados; foi então que aprendi a ler e escrever o árabe também. 

Você tem parente no Líbano, mantém contato com eles?
Sim. Tenho parentes em Beirute, Hasbaya e Marjayoun. Esta também é outra história lindíssima que em outra ocasião terei a oportunidade de contar. A família que ficou no Líbano perdeu o contato com os familiares que imigraram para o Brasil, por ocasião da guerra e distância entre os países. Apenas conseguiram conhecer e ter contato com os filhos (meu pais e demais parentes) destes imigrantes (meus avôs) depois de 50 anos. 


Quais são os fundamentos da dança oriental, em que os movimentos são inspirados?
Segundo historiadores, alguns movimentos são provenientes da imitação de certos animais considerados sagrados nas civilizações antigas. Também esta dança reflete toda a história e intercâmbio de diferentes culturas que habitaram o Oriente Médio.


Por que classificar a dança como oriental e não como árabe? A dança oriental é a mesma coisa que dança do ventre?
A dança oriental não é apenas um legado dos árabes. Diferentes culturas fizeram parte da história do Oriente Médio. A mistura de influências teve consequências em diversos aspectos da cultura, um deles foi a dança. Este mesmo estilo de dança ou de movimentos pode ser encontrado, além de nos países árabes, na Grécia atual e antiga, Turquia, antiga Pérsia, países do leste europeu, África, etc. Outro ponto importante é que nos países árabes esta dança é chamada de raks el sharki, que significa dança do oriente. Este nome pejorativo dança do ventre foi criado no ocidente.

Quando foi a primeira vez que você fez uma apresentação de dança oriental fora do Brasil? Ao se apresentar em um país árabe, qual foi sua sensação? Houve algum tipo de insegurança? E hoje, como é?
Minha primeira apresentação fora do Brasil foi em Nova Iorque. O primeiro país árabe em que dancei foi o Líbano. Acho que em palavras é difícil descrever a sensação de estar em um lugar que faz parte tanto da história desta dança quanto das minhas origens. Posso dizer que me senti extremamente realizada como pessoa e profissional, foram passos decisivos na minha carreira. Hoje, dançando tanto aqui como no exterior, me sinto muito gratificada por ter escolhido a arte como carreira, apesar do esforço e dedicação que a dança requer.

O que você acha do cenário da dança oriental no Brasil? É possível fazer uma comparação com outros países?
Acho que a dança oriental teve um desenvolvimento e possuímos profissionais que representam muito bem o Brasil no exterior. Porém, de um modo geral, acho que ainda temos um longo caminho a percorrer em termos não só de técnica na dança, mas também de mentalidade profissional. Falta também um pouco de união entre as bailarinas. Mesmo existindo certa competição na área, o que é normal e saudável, pode existir união entre os profissionais.

Você já passou por alguma saia justa em algum país muçulmano  em que a dança não é bem vista?
Não, isso nunca aconteceu. Sempre trabalhei pela arte e sempre estive em lugares respeitáveis do Oriente Médio. Acho que em qualquer lugar o que faz as pessoas te respeitarem é a sua postura em relação ao trabalho.

O que você acha dos países que proíbem as dança?
Acho que perdem muito, pois às vezes não sabem valorizar sua própria cultura. Por exemplo, na Espanha, o flamenco durante certa época era apenas uma dança de taberna, hoje é apresentada nos melhores teatros do mundo e seu povo se orgulha desta arte.

Que experiências interessantes e curiosas você já teve na passagem por outros países?
Tive muitas. Uma que me pareceu interessante foi em Sevilha, na Espanha. Eu estava ensaiando, junto a um guitarrista e outra bailarina sevilhana de flamenco, um número de fusão flamenco-árabe.  Acontece que este estúdio era num segundo andar e possuía aquelas janelas com portas que dão a uma varanda, estilo típico andaluz. As pessoas que passavam na rua podiam ver o ensaio. Estávamos tão concentrados e quando terminamos escutamos vários olés! Havia um grande público na rua assistindo ao ensaio, homens, mulheres, crianças, e como ali eles curtem muito a dança,  fomos muito aplaudidos. Foi uma surpresa engraçada!

Quais são os seus planos futuros para o exterior e para o Brasil?

Vou seguir dando cursos e fazendo apresentações no exterior, desenvolvendo um trabalho muito sério  e profissional aqui. Pretendo seguir formando pessoas no Brasil e no mundo, além de montar minha própria escola.

Você atuou na novela O clone, da Globo. Você acha que o interesse do povo pela cultura árabe, em especial pela dança, que na época a novela despertou, permanece? Naquele período, você identificou alguma visão equivocada passada pela novela sobre a cultura e a dança árabes?
Acho que naquela época existia mais interesse, sim. De certa forma, isso foi bom e ruim. De um lado cresceu o número de adeptos e interesse por conhecer a cultura árabe, por outro, acho que a imagem desta dança ficou um pouco saturada também. A novela fazia certos comentários reais sobre a cultura islâmica, mas ao mesmo tempo não mostrava a realidade cotidiana dos árabes.

Qualquer pessoa pode aprender dança oriental? Qual é a idade mais indicada para iniciar?
Claro que sim, qualquer pessoa pode aprender. Por não fazer parte da nossa cultura, algumas pessoas possuem mais facilidade, outras menos. Mas devemos partir de um princípio que nos países árabes todos dançam, desde os pequenininhos até as senhoras com mais idade. É uma dança que faz parte de uma cultura, não é apenas técnica. Claro que para cada idade devem ser usados exercícios e técnicas específicas.

Onde você ensina dança oriental aqui no Brasil, em São Paulo?
Tenho meu próprio estúdio, onde ministro minhas aulas e dou cursos mensais. Para saber meus horários, shows, workshops, etc., é só acessar meu site o www.fadua.pro.br. Estou também no twitter e facebook.

 

Com informações de http://www.fadua.pro.br/ e Revista Danza Oriental( Madri / Outubro de 2002)

Colaborou Leandra Yunis