Série de verbetes informativos sobre os árabes: Antissemitismo, por Arlene Clemesha

Sex, 27/06/2025 - 15:07
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Confira mais um verbete da série especial do ICArabe, que tem como objetivo aprofundar o conhecimento sobre o mundo árabe com responsabilidade e rigor. A iniciativa reafirma o compromisso da instituição com a disseminação de informação de qualidade e a superação de estereótipos, fortalecendo o caminho para uma sociedade mais consciente e bem informada.

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Antissemitismo

O antissemitismo é uma forma de preconceito ou ódio racial dirigido contra os judeus como indivíduos ou grupo, apenas por serem judeus. Como todo ódio racial, ele é irracional e não está ancorado na realidade. Diz mais do antissemita - aquele que exerce o preconceito - do que de sua vítima, a pessoa de origem religiosa ou étnica judaica.

‘Semita’ é um termo originalmente usado para descrever grupos linguísticos descendentes de Sem/Sham, compreendendo uma família de idiomas que inclui o árabe, o hebraico, o amárico, o aramaico e o trigínia. 

O termo “antissemitismo” foi cunhado no final do século XIX, não obstante o ódio aos judeus já existir desde a época romana e ter assumido diferentes características ao longo da história. No período feudal, as acusações incluíam o “libelo de sangue” (acusação supersticiosa de que os judeus sacrificavam ritualmente crianças cristãs), o “judeu deicida” (forjando a ideia do judeu traidor de Jesus Cristo) e o ódio contra o “comerciante e usurário” por parte de uma sociedade cristã e agrícola.

A partir do século XIX tornou-se um ódio de tipo racial e racista, que continuou a reproduzir os típicos preconceitos medievais, acrescidos de ideias fantasiosas de “conspiração” e “dominação mundial dos judeus”. Os judeus foram utilizados como bode expiatório do regime tsarista, que popularizou o termo pogrom (ataques violentos contra judeus na Rússia imperial durante os séculos XIX e XIX) para todos os idiomas.

Como todo ódio racial no período moderno, o antissemitismo foi empregado para justificar estruturas de dominação e expansão imperialista. O regime nazista, com suas ideias de supremacia racial e “espaço vital”, levou o antissemitismo e a desumanização dos judeus às últimas e pavorosas consequências - o genocídio.

Hoje, o preconceito contra os judeus costuma reproduzir imagens que percorreram todos os períodos da história europeia, desde a ideia do judeu como “explorador" e “banqueiro”, até as típicas elocubrações de uma suposta dominação mundial.

Finalmente, um dos maiores empecilhos à compreensão e ao combate ao antissemitismo é a atual tendência de se definir o antissionismo - a oposição a uma doutrina política - como uma nova forma de antissemitismo, ou seja, como um novo racismo. O intuito dessa falaciosa tipificação é criminalizar a pessoa que se opõe à ideologia política do sionismo (movimento originado na Europa durante o século XIX objetivando criar um lar nacional judaico na Palestina), e blindar o Estado de Israel de críticas por seus atos, inclusive quando ele realiza o crime dos crimes, o genocídio do povo palestino.

*Nota-se que o termo antissemitismo é impreciso. Os árabes também possuem origens consideradas semíticas e são alvo de preconceitos crescentes. Mas o preconceito anti-árabe não costuma ser denominado de antissemitismo. Sendo que tanto o racismo anti-árabe como a islamofobia possuem raízes ideológicas muito semelhantes àquelas do antissemitismo moderno.

ar

Arlene Clemesha é professora Dra. de História Árabe do Departamento de Letras Orientais da Universidade de São Paulo. Diretora e membro fundador do Centro de Estudos Palestinos da Universidade de São Paulo (CEPal-FFLCH/USP). Seus livros incluem “Marxismo e Judaísmo, história de uma relação difícil” (São Paulo: Boitempo); “Palestine 48-08” (Tehran: DEFC em farsi e inglês); “Edward Said: trabalho intelectual e crítica social” (co-org/SP: Casa Amarela); “Brazil and the Middle East: the Power of Civil Society” (co-org./IRI-USP), entre outros. Arlene Clemesha possui artigos publicados em inglês, espanhol, francês, italiano, árabe e farsi. Ela atuou como tradutora de Edward Said ao português, incluindo o livro “Freud e os Não-Europeus” (Boitempo).