Os 40 anos de 1967 - parte 2
Ato relembra 40 anos da ocupação
Depois da Guerra dos Seis Dias, com a ocupação dos territórios de Jerusalém, Gaza e Cisjordânia, os palestinos viram o horizonte de soberania desaparecer. Estavam em mãos israelenses e poderiam contar apenas com suas próprias ações para terminar a opressão que começaram a sofrer desde 1948.Ao fim da atividade cultural “O Mundo diz Não à Ocupação Israelense”, promovida pelo Instituto da Cultura Árabe, sábado dia 9, para lembrar os 40 anos da ocupação de Jerusalém, Cisjordânia, Gaza e Colinas do Golã (estas, da Síria), o palestino Abder Raouf Ibrahim Yousuf Misleh, nascido em uma aldeia perto de Tulkarem, Palestina, despede-se de mim com um aperto de mão respeitoso. Vai, então, cumprimentar Abdel Latif, conterrâneo seu. O abraço que ambos deram ali foi a forma mais clara de explicar o que os palestinos da diáspora sentem depois de quase 60 anos da al-Nakba (a tragédia de 1948) e de 40 depois da invasão dos territórios que lhes sobraram (em 10 de junho de 1967). O conjunto de gestos mostra a série de sentimentos que dividem. O que têm em comum é uma história coletiva recheada de dor, deslocamento, distância, ausência, resistência, mortes, necessidades, muros, postos de controle, diáspora, acordos, frustrações. Abdel Latif é médico intensivista, natural de Bethlehem (Belém), que migrou em 1991 depois de casar-se com brasileira descendente de palestinos. Não foi permitido a ela viver lá, então vieram para o Brasil. Para Latif, até hoje existe um grave problema conceitual nas discussões que permeiam o debate da questão, pois se consolidou a visão que retrata o conflito como militar ou um problema de terrorismo. Essa abordagem ignora ou coloca em segundo plano questões cruciais e decisivas para o entendimento atual do quadro de opressão aos palestinos. No rol de fatos que contam a história da ocupação, 1967 tem um lugar decisivo. “Aquilo foi uma segunda nakba, um momento que fez os palestinos desistirem da falsa percepção de que um regime árabe poderia libertar a Palestina. A partir de então, deveríamos assumir o controle da luta contra a ocupação”, explica o médico. Desde a invasão das terras onde foram encurralados os palestinos depois da criação de Israel, em 1948, e que são consideradas pela ONU como um Estado soberano, foram presos 650 mil palestinos e 12 mil casas foram derrubadas. Outros capítulos trágicos - Parte da atividade cultural do dia 9 foi a apresentação do Núcleo Entrelinhas de teatro com dois trechos da peça “Os Meninos e as Pedras”, com a qual estão em cartaz até 2 de julho no Espaço Cênico Viga - Sala Porão. A primeira cena foi o encontro das potências imperialistas em 1922 para definir a divisão do Oriente Médio pós 1ª guerra. A Palestina, com o Iraque, pertenceria ao Mandato Britânico. Um documento importante que definiu a partilha e abriu as portas para a criação de Israel foi a Declaração Balfour, uma carta de Arthur James Balfour, então secretário de exterior britânico, que diz ao banqueiro sionista Lord Rotschild: “Tenho muitas satisfação em comunicar-lhe, em nome do Governo de Sua Majestade, a seguinte declaração de simpatia com as aspirações dos judeus sionistas, que foi submetida e aprovada pelo Gabinete: ‘O Governo de Sua Majestade vê com aprovação o estabelecimento na Palestina de um lar nacional para o povo judeu, e fará todos os esforços para facilitar a obtenção de tal objetivo, ficando claramente expresso que nada será feito que possa prejudicar os direitos civis e religiosos de comunidades não-judaicas na Palestina ou os direitos e status políticos dos judeus em qualquer outro país’”. A carta é de 1917 e está reproduzida, ao lado de outros documentos que fazem parte da trajetória da criação de Israel e da ocupação da Palestina, no livro “A Guerra da Palestina”, do historiador André Gattaz. A criação de Israel seria concretizada em 15 de maio de 1948. Nesse momento, começa a avalanche de violência por parte das forças sionistas que deslocaria os palestinos para fora de suas terras, a primeira al-Nakba (catástrofe). Naquele momento, 80% de suas casas foram destruídas. Como define Abdel, “a construção de Israel foi baseada em um plano imperialista que usa um mito religioso para criar e sustentar uma entidade política”. Longe da mitologia que foi criada para justificar Israel, os palestinos vivem problemas terrenos que precisam de uma solução urgente. O cerne da questão para os palestinos é que o acesso à terra e à possibilidade de ter uma vida justa são completamente usurpados pelo Estatuto judeu. Para Abdel, é uma aberração que aos palestinos, com famílias que há gerações e gerações habitam aquelas terras, não seja permitido o acesso à cidadania. “Por outro lado, qualquer judeu de qualquer lugar do mundo ganha cidadania israelense no momento em que pisa no aeroporto de Tel Aviv”. Outro capítulo dramático para os palestinos é escrito desde 2002, com o início das obras que levantaram muros cercando cidades palestinas e fragmentando o território da Cisjordânia. “A Palestina sempre teve uma sociedade multicultural, aberta. Sempre houve ali a possibilidade de diferenças viverem juntas. O que o muro representa é o auge da força militar de Israel, mas também a decadência da ideologia sionista. Moshe Nuhaim, um pensador judeu nascido em Haifa, Palestina, conta a história de um dentista palestino que tratava os pobres de graça, entre eles, muitos judeus. A família desse dentista foi uma das primeiras a ser expulsa de Haifa. O sionismo é a antítese da convivência pacífica entre árabes e judeus”.