Heróis ou terroristas
Como devemos classificar as ações de grupos armados no interior da região palestina? Principalmente as ações relativas ao fim da ocupação franco-britânica na região. Numa tentativa pautada pela imparcialidade podemos recorrer ao dicionário de política do professor Norberto Bobbio. Será que a alcunha terrorista lhe cabe? Para Bobbio, o termo terrorista é designado para identificar um ato individual ou coletivo com o livre propósito de disseminar o terror, não necessariamente com um fim político. Este a meu ver desapropriado. O termo “Terror” vem sendo usado erradamente desde a administração Reagan (1981-1989) como todo ato contrário à segurança das potências dominantes. Termo originado na Revolução Francesa, para designar o período compreendido entre setembro de 1793 e março de 1794, caracterizado pela violência e pelas execuções utilizadas pelos revolucionários.
Organizações como Hamas, Hezbolah e Fatah na verdade se enquadram na definição dos movimentos de resistência contra invasão estrangeira. Como bem se auto-intitulou o Hamas (Movimento de Resistência Islâmica). Modelos estes que existiram durante muito tempo na América Central, como a Frente Farabundo Martí de Libertação Nacional (FMLN), em El Salvador, e a Frente Sandinista de Libertação Nacional, na Nicarágua (FSLN), e que persistem no continente africano. Estes grupos lutam pelo direito de existirem em seu solo. Solo que é a base real da política. Este que tem um papel importantíssimo na definição de um povo que passa pela existência em uma área de fronteiras consolidadas. O solo que representa uma necessidade dupla: a de habitação e sobrevivência. Relação que permanece quase invariável no tempo. É a luta pela libertação nacional.
A análise da questão em voga passa por uma análise do direito internacional. Israel desde 1947 desrespeita a resolução nº181 de 1947 da Organização das Nações Unidas que partilha a região entre dois povos. Sem contar tantas outras posteriores a essa.
A usurpação de Israel sobre as terras dos palestinos baseia-se, segundo o direito internacional, em três aspectos principais: 1. a usurpação do poder político (uso da força para a conquista territorial); 2. usurpação do território (ocupação de terras que não são suas) e 3. ausência de qualquer base jurídica para a sua proclamação como Estado, segundo o direito internacional (a ONU não teria esse poder de criar Estados e ainda depois admiti-lo como membro e este passar a ter direito de voto nas decisões).
A Geopolítica, ramo da ciência geográfica, nos seus mais variados vieses ideológicos, tem em Paul Claval, na obra “Espaço e Poder”, uma colaboração para entender esse conflito. Quando aborda a geometria das formas elementares de poder, nos esclarece um entendimento sobre a política expansionista do Estado de Israel, quando diz que o poder nasce, por vezes, do recurso ao constrangimento físico. Isso evidenciado ao enorme constrangimento que passa a população palestina, tendo suas casas invadidas e ameaçadas com tanques de guerra e o uso demasiado de recursos tecnológicos, determinadas pela nítida preponderância do poder bélico de Israel. Quando do outro lado, eles se defendem com paus e pedras na chamada Intifada.
E a população palestina o que pensa sobre a ação fundamentalista dos grupos radicais árabes? Para boa parte do povo árabe, estas são ações de legítima defesa de soberania. Homens que defendem com a própria vida o direito de existir do povo palestino. Sendo freqüente o alistamento de parentes destes para preencher as fileiras da militância árabe contra a invasão estrangeira do Estado de Israel. E tudo amparado por uma política social por parte das autoridades palestinas, que não deixam familiares de mártires sem o devido aporte assistencial.
Ao observarmos a população israelense, há de se lamentar que o cidadão médio não veja o conflito pelo ângulo da política internacional, mas tão somente pelos seus conteúdos de agressão e violência generalizada. No entanto, um alento mais recente coloca novos ares na geopolítica da região. Em pesquisa, publicada pelo jornal israelense Haaretz, revelando que 64% dos israelenses apóiam negociações diretas entre o governo de Israel e o Hamas. Apenas 28% são contra e 8% disseram não ter uma opinião formada sobre o assunto. Pesquisas anteriores davam números menos expressivos, na casa dos 30%, o que demonstra a exaustão de um povo cansado de uma guerra que já dura bem mais do que data a fundação do Estado Judeu. Opinião que ganha voz entre os militares israelenses, os chamados “Refuseniks”, termo utilizado para designar o militar que se recusa a cumprir ordem superiores de excessivo poder bélico contra alvos civis. Negociar não é fácil, principalmente quando interesses de outros Estados estrangeiros convergem na região. Principalmente do quarteto: ONU, União Européia, Estados Unidos e Rússia.
Essa é uma guerra em que não há perdedores ou vencedores. O fim dos conflitos na região passa pelo reconhecimento do Estado de Israel, do direito de existir dos povos árabes na região. Existir soberanamente, isto inclui a volta dos refugiados palestinos, a retirada de 150 assentamentos judaicos ilegais, onde vivem mais de 300 mil colonos judeus fortemente protegidos pelo Estado de Israel, a definição de uma capital árabe e o status definitivo sobre Jerusalém.