ICArabe integra debate sobre o filme argelino 'Papicha', escolhido para representar o país no Oscar 2020

Qui, 31/10/2019 - 17:47

Por Clara Zaim

Nesta quarta, 30 de outubro, o Instituto da Cultura Árabe - ICArabe, em parceria com Pandora Filmes e o jornal O Estado de S.Paulo Estadão, participou de uma sessão especial seguida de debate do filme argelino "Papicha”. O evento aconteceu no cinema Petra Belas Artes, em São Paulo, e contou com participações de Salem Nasser, professor de Direito e Relações Internacionais da Fundação Getúlio Vargas – FGV e ex-presidente do instituto, dos jornalistas Luiz Carlos Merten (crítico de cinema) e Ubiratan Brasil (editor do Caderno 2), e da antropóloga Carol Delgado. O longa da diretora Mounia Meddour representará a Argélia na disputa pelas indicações do Oscar 2020 e também foi destaque da Mostra Um Certain Regard, na última edição do Festival de Cannes.

Papicha, que estreia no Brasil, nesta quinta-feira, 31 de outubro, com distribuição da Pandora Filmes, acompanha a trajetória da jovem Nedjma, logo após o início da Guerra Civil da Argélia, que durou de 1991 a 2002.

Nedjma é uma estudante universitária, apaixonada por moda. Seu sonho é realizar um desfile com uma coleção inteira de trajes tradicionais desenvolvida por ela. Mas, com o extremismo tomando força e o país tornando-se cada vez mais conservador, ela luta para manter sua liberdade e independência e ter seu lugar no mundo respeitado. Outros aspectos abordados na narrativa são a amizade, o companheirismo, a lealdade e o amor existente entre a protagonista e as outras personagens.

Para o professor Salem Nasser (ex-presidente do ICArabe), a produção faz uma crítica à violência, mostra aspectos do excesso de religiosidade e a recuperação da identidade. Os temas, segundo ele, são abordados com muita sutileza. "O filme mostra a opressão e o momento de reconstrução. A protagonista quer criar laços e reconstruir uma vestimenta tradicional. Há um acolhimento entre as personagens para a luta e a reconstrução de suas vidas", frisou.

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A antropóloga Carol Delgado destacou que apesar do longa contar sobre a guerra civil, que teve início em 1991, ele é muito atual. "O filme é muito forte. É uma loucura identificar os gatilhos do filme no cotidiano atual. Quanto custa a produção genial das pessoas que estão na base? Trabalharam no simbólico. A cena mais marcante é quando ela pega o tecido e tinge de maneira natural em um momento de desespero para tentar resgatar a memória da irmã que foi assassinada”, descreveu. “A vivência da base não tem preço, é para provocar de uma outra maneira. As personagens são humanizadas em suas relações e mostra a luta das mulheres em meio à guerra", completou ela.

Delgado, que transita pelas áreas de moda e cultura urbana, explica que este é um meio tenso e as vestimentas mostram o que acontece na sociedade. Para ela, é possível ver o destaque e conhecer estilistas árabes no cenário mundial:
"Os estilistas de todos os países conversam entre si por meio das redes sociais. Reúnem estética, criatividade e segurança", finalizou.

Para o jornalista e crítico de cinema, Luiz Carlos Merten, do jornal O Estado de São Paulo, o filme é muito interessante, discute sobre o espaço da mulher e é atual.

"Papicha é candidato ao Oscar pela Argélia. A diretora mostra, por meio de símbolos, a violência e o que está acontecendo no meio social das estudantes argelinas. O filme encanta pela luta e juventude. A diretora pegou o desfile de 92 para mostrar o momento atual", salientou.

O crítico ainda fez um paralelo entre a Argélia dos anos 90 com o momento atual político brasileiro. "A Argélia dos anos 90 representa o momento político que o Brasil vive hoje apesar do presidente ter sido eleito democraticamente. Será que o mundo evoluiu nesses 28 anos? O quanto evoluiu?", questionou Merten.

Mounia Meddour

A diretora Mounia Meddour contou que o longa é em parte uma autobiografia e dedicado ao seu pai, que era cineasta. Quando tinha 17 anos, cursava faculdade e ao final do primeiro ano sua família precisou deixar a Argélia, pois intelectuais e artistas estavam sendo ameaçados. “Todas as experiências da protagonista na universidade representam o dia-a-dia das estudantes argelinas no final dos anos 90. Incluindo eu”, lembrou. “Com o fundamentalismo em ascensão, a opressão vinha de todos os lados. Muitas garotas se esforçavam muito para chegar à universidade e morar no campus, para estudar, claro, mas também para ter um pouco de liberdade, fugindo do domínio de sua família”, afirmou a diretora.