Série de verbetes informativos sobre os árabes: Memoricídio, por Badra El Cheikh
Confira o novo verbete da série especial do ICArabe! A iniciativa busca aprofundar o conhecimento sobre o mundo árabe com conteúdo responsável e qualificado, reforçando o compromisso da instituição com o combate a estereótipos e a promoção de uma sociedade mais crítica e bem informada.
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Memoricídio
Memoricídio é a eliminação intencional da memória coletiva de um povo através da supressão de referências históricas, culturais e simbólicas, sendo o genocídio em Gaza a ilustração mais premente. O termo foi cunhado em 1991 por Mirko Dražen Grmek ao descrever a destruição do patrimônio croata durante a Guerra de Independência. Desde então, tem sido empregado para denunciar práticas de limpeza étnica e genocídio cultural, como na Guerra da Bósnia (1992–1995), no genocídio armênio e nos processos coloniais europeus que visaram a erradicação das culturas e identidades de povos tradicionais ao redor do mundo.
No caso palestino, o termo é amplamente discutido por intelectuais como Nur Masalha e Ilan Pappé, que apontam essa prática como um pilar fundamental do projeto colonial sionista. Ao apagar os vestígios da presença histórica palestina, o objetivo é legitimar e popularizar uma narrativa fabricada, a fim de tornar inquestionável uma história construída sobre o silenciamento forçado de outro povo.
Esse processo não se limita ao apagamento contínuo de cidades, vilas, arquivos históricos ou monumentos. Também inclui a renomeação de cidades e vilas palestinas com nomes hebraicos, a instrumentalização da arqueologia, a remoção da Palestina dos mapas e dos currículos escolares e o lobby anti-palestino e suas práticas de silenciamento em todo o mundo para negar a existência dos palestinos na Palestina e no exílio. Soma-se a isso a apropriação indevida de elementos da cultura milenar palestina, como a culinária tradicional, os bordados (tatreez) e danças folclóricas como o dabke, que são frequentemente apresentados como parte da identidade “cultural israelense”.
É um apagamento que visa não apenas o passado, mas o próprio direito a um futuro. De acordo com Masalha, esse processo faz parte de uma “colonização da memória” que busca distorcer a identidade palestina.
O memoricídio é, acima de tudo, uma tentativa de romper os laços entre o povo palestino e sua terra, minando sua identidade e enfraquecendo sua continuidade histórica. Cada narrativa silenciada, cada oliveira arrancada, reforça essa lógica de apagamento. Diante disso, a resistência está enraizada na preservação da memória: contar histórias, manter nomes, reconstruir arquivos. Assim como o sumud, a memória viva desafia o apagamento.
Badra El Cheikh, Oficial de Advocacy e Campanhas do PIPD no Brasil. O Instituto Palestino de Diplomacia Pública (PIPD) é uma organização não governamental independente que defende a libertação da Palestina de todas as formas de colonialismo, bem como o avanço da diplomacia do povo palestino e de um movimento liderado pelos palestinos.