O futuro político do Egito: Irmandade Muçulmana não assusta setor financeiro
O Egito passa por um período de intensas transformações políticas de forma inédita. Durante o período de um ano assistimos a tomada da praça Thahir, a queda de Mubarak, mobilizações populares frequentes, conflitos violentos, eleições parlamentares e agora a finalização de uma primeira etapa desse processo político: a eleição presidencial. Apesar de ainda ser incerto o futuro político do Egito, pois ainda não está bem definido o conjunto de forças políticas no momento, é improvável que ocorra um golpe militar ou uma revolução islâmica nos moldes do Irã.
Talvez o último debate eleitoral entre os principais candidatos presidenciais revela-nos o caminho pelo qual seguirá a transição do regime político. Os momentos mais acalorados do debate entre ex-membros do antigo governo (Amr Moussa e Ahmed Shafiq) e Abdel Fotouh, ex-dirigente da Irmandade Muçulmana, ocorreu quando houve questionamentos a respeito de suas relações com aliados políticos do passado que poderiam comprometer a transição democrática. Quase não houve divergência sobre questões relacionadas às reformas econômicas, à religião ou ao papel dos militares.
As infindáveis referências que a mídia ocidental faz sobre a possibilidade de uma reforma da constituição instituindo a sharia islâmica como uma das questões mais importantes em um novo regime não passa de uma manobra diversionista. O fato a ser destacado é que a nova posição da Irmandade Mulçumana sobre a política econômica tem merecido elogio por parte dos políticos norte-americanos, muito bem simbolizado na abertura da Bolsa de Valores egípcia pelos senadores John Kerry e John McCain em junho do ano passado. O que indica que se formou um consenso entre as elites econômicas e políticas nacionais e internacionais articulando seus interesses na manutenção de um capitalismo nos moldes liberais, mesmo com o parlamento dominado pelos partidos islâmicos.
Por fim, não se pode esquecer, evidentemente, da principal peça política dessa articulação: os militares. Já não é mais segredo para a população a influência que as forças armadas têm no país, inclusive sobre a economia. Ao longo de décadas, a ditadura, com a ajuda econômica dos EUA, possibilitou que os militares construíssem um complexo industrial muito bem estruturado e financiado além de atuar fortemente na área de serviços e turismo. Se os egípcios querem realmente se afastar do passado, em algum momento, os militares terão que prestar conta de seus negócios, seus privilégios, subsídios, benefícios fiscais já que não estão sujeitos a qualquer controle parlamentar ou governamental.
Entretanto não se pode esquecer que toda essa história dos protestos teve início, em 2006, numa grande onda de greves de trabalhadores cujo objetivo não era apenas a luta pela democracia, mas também uma veemente condenação do capitalismo neoliberal conduzido por Mubarak e os militares. A realização das aspirações dos egípcios exigirá mais do que uma reforma constitucional ou a realização de eleições instituindo novas lideranças políticas. As forças que destituíram Mubarak ainda não derrubaram seu regime econômico. O desafio é encontrar uma maneira de transformar a revolução que têm ocorrido no âmbito das ideias e do comportamento político em uma nova forma de organização social e econômica. Assim, ainda que as instituições permaneçam as mesmas, já não é o mesmo Egito de antes.
Talvez o último debate eleitoral entre os principais candidatos presidenciais revela-nos o caminho pelo qual seguirá a transição do regime político. Os momentos mais acalorados do debate entre ex-membros do antigo governo (Amr Moussa e Ahmed Shafiq) e Abdel Fotouh, ex-dirigente da Irmandade Muçulmana, ocorreu quando houve questionamentos a respeito de suas relações com aliados políticos do passado que poderiam comprometer a transição democrática. Quase não houve divergência sobre questões relacionadas às reformas econômicas, à religião ou ao papel dos militares.
As infindáveis referências que a mídia ocidental faz sobre a possibilidade de uma reforma da constituição instituindo a sharia islâmica como uma das questões mais importantes em um novo regime não passa de uma manobra diversionista. O fato a ser destacado é que a nova posição da Irmandade Mulçumana sobre a política econômica tem merecido elogio por parte dos políticos norte-americanos, muito bem simbolizado na abertura da Bolsa de Valores egípcia pelos senadores John Kerry e John McCain em junho do ano passado. O que indica que se formou um consenso entre as elites econômicas e políticas nacionais e internacionais articulando seus interesses na manutenção de um capitalismo nos moldes liberais, mesmo com o parlamento dominado pelos partidos islâmicos.
Por fim, não se pode esquecer, evidentemente, da principal peça política dessa articulação: os militares. Já não é mais segredo para a população a influência que as forças armadas têm no país, inclusive sobre a economia. Ao longo de décadas, a ditadura, com a ajuda econômica dos EUA, possibilitou que os militares construíssem um complexo industrial muito bem estruturado e financiado além de atuar fortemente na área de serviços e turismo. Se os egípcios querem realmente se afastar do passado, em algum momento, os militares terão que prestar conta de seus negócios, seus privilégios, subsídios, benefícios fiscais já que não estão sujeitos a qualquer controle parlamentar ou governamental.
Entretanto não se pode esquecer que toda essa história dos protestos teve início, em 2006, numa grande onda de greves de trabalhadores cujo objetivo não era apenas a luta pela democracia, mas também uma veemente condenação do capitalismo neoliberal conduzido por Mubarak e os militares. A realização das aspirações dos egípcios exigirá mais do que uma reforma constitucional ou a realização de eleições instituindo novas lideranças políticas. As forças que destituíram Mubarak ainda não derrubaram seu regime econômico. O desafio é encontrar uma maneira de transformar a revolução que têm ocorrido no âmbito das ideias e do comportamento político em uma nova forma de organização social e econômica. Assim, ainda que as instituições permaneçam as mesmas, já não é o mesmo Egito de antes.
Reginaldo Mattar Nasser, Professor do Departamento de Relações Internacionais da PUC/SP e membro colaborador do ICArabe