A Palestina e a Rosa de Jericó
A Professora Fátima Asfora, amiga e companheira do ICArabe, que reside em Recife, nos enviou um texto com curiosidades intrínsecas desta flor e sua ligação com a Palestina.
Conhecida desde tempos remotos como a flor da ressurreição, a rosa de Jericó motivou o surgimento de uma lenda das mais expressivas do Oriente Médio, e de forma particular da Palestina. Sua narrativa atrai um público seleto, estendendo-se atualmente por inúmeros países do mundo ocidental.
As referências sobre essa planta, independente da lenda, podem ser encontradas em diversas épocas, embora de forma esparsa. No Antigo Testamento (Eclesiástico 24:18), capítulo Elogio da Sabedoria uma frase denota a abundância das rosas existentes naquele local: ”Cresci como a palmeira nas praias, como as roseiras de Jericó”.
Em 2005, foi publicado em Barcelona o livro “La Rosa de Jericó”, no qual Francisco Martos tratou da inclusão desse símbolo no pacto de não agressão de Saladino I à Ricardo Coração de Leão no tempo das Cruzadas. Recentemente, o interesse centralizado no tema da lenda da Rosa de Jericó parece ter crescido de forma significativa, devido ao ciclo de reivindicações e protestos no mundo árabe,surgido a partir do final de 2010.
Causado pelo colapso dos projetos pós-coloniais e pelas carências resultantes da população penalizada por três décadas de governos neoliberais o referido ciclo de mobilizações populares está sendo identificado na História Contemporânea como Primavera Árabe. É nessa conjuntura que a luta dos palestinos ocupa um lugar relevante, devido a sua trajetória em direção ao seu estado independente, tendo Jerusalém como capital.
Sobre a resistência dos palestinos Garcia (2011) registra que a rosa de Jericó vem sendo tomada como símbolo para tornar visível o fato de que apesar da violência dos israelenses os objetivos políticos do povo e do estado da Palestina serão alcançados. Fazendo menção às características dessa planta o autor ressalta que ela caminha como peregrina pelas areias do deserto, suportando temperaturas extremas, mas basta sentir umidade nas suas folhas para que ela se abra e retorne assombrosamente à vida. Assim sendo, evidenciou Garcia, que para os palestinos a votação e aceitação da UNESCO na esfera da cultura e das ideias de paz causaram um efeito equivalente à umidade para a rosa de Jericó.
A seguir focalizaremos algumas características dessa planta, para que seja sua simbologia seja melhor compreendida no contexto da questão palestina.
Com suas pequeninas flores brancas, tendo em média quinze centímetros de altura e aparência frágil, ela demonstra uma espécie de defesa diante da ausência total de chuvas. Nesse período as suas folhas caem e seus ramos se contraem, curvando-se para o centro, adquirindo uma forma esférica, capaz de abrigar as sementes e protegê-las da aridez dos desertos.
Assim, mesmo frágil e ressequida, ela continua como “peregrina”, devido à quase inexistência das suas raízes, o que facilita seu deslocamento. Transformada em “viajante incansável”, ela é conduzida pelo vento do deserto, que tem a força de arrancá-la do solo e arrastá-la por áreas distantes, período no qual ela permanece seca e fechada, podendo até parecer totalmente sem vida por alguns meses. Entretanto ao chegar à fase anual das chuvas ou bastando algum contato com a umidade a Rosa de Jericó estende suas folhas, espalha suas sementes e retorna à vida, mostrando sua beleza. De acordo com a lenda os viajantes daquela área narravam que o vento arrancava a rosa de Jericó do chão todas as vezes que Jesus se dirigia para orar no deserto.Ao transportá-la até bem próximo ao Mestre ela realizava seu desejo que era o de oferecer um pouco de água a Jesus para aplacar sua sede.
Chegando aos seus pés, ela suavemente fazia sua oferta a Jesus e este com as pontas dos seus dedos levava algumas gotinhas d’água aos lábios. Comovido pelo gesto da rosa de compartilhar sua água, naquele ambiente arenoso e de temperatura elevada ele agradecia, bendizia a planta e seguia seu caminho.
Por esses encontros com Jesus e pelas bênçãos que a planta recebeu todas as pessoas que encontravam uma Rosa de Jericó recebiam fluídos de luz divina e passavam a tratá-la como objeto sagrado.
Superstições e outras tradições místicas passaram a reconhecer nessa planta um amuleto de imenso valor, que estando presente nas casas realizava os desejos dos seus habitantes, além de afugentar as más vibrações.
Atualmente é interessante registrar a presença das Rosas de Jericó em sites de ocultismo e magia como mercadorias expostas à venda nos mais diversos países. Nesses sites são reproduzidos poderes mágicos da planta, acompanhados de instruções como proceder, visando a sua manutenção. Este exemplo, típico da sociedade de mercado do mundo contemporâneo, revela claramente o poder do capital em debilitar vínculos, “desterritorializar” objetos, ideias tornando os mercados cada vez mais extensos, em prol dos grupos econômicos mais favorecidos.
Entretanto devido à própria dinâmica do mundo globalizado, na qual as mercadorias e serviços se movimentam em direções múltiplas, algumas vezes contraditórias, é necessário que seja evidenciado que aquelas mesmas Rosas de Jericó, colocadas à venda em sites de ocultismo e que aparentemente estão desvinculadas da história e da cultura palestina, são as mesmas que estão representando de maneira paradigmática a resistência do seu povo, a sua capacidade de oferecer o melhor de si em qualquer circunstância.