Jericó e a chance de desmascarar a violência do Estado de Israel e a cumplicidade do Ocidente
A invasão militar israelense da cidade de Jericó, na Cisjordânia, ocorrida dia 14 último, tinha um objetivo primordial: provocar uma nova escalada de violência na região. Os cinco prisioneiros políticos seqüestrados na operação são, de fato, vítimas pela segunda vez da mesma política israelense de instigar a violência com fins políticos.
Desta vez, o motivo foi eleitoral. O premiê em exercício, Ehud Olmert, já está colhendo os frutos da operação. Faltando duas semanas para as eleições nacionais, o seu partido, o “centrista” Kadima (fundado por Ariel Sharon), está crescendo significativamente nas pesquisas de intenção de voto. Até o seu rival, Binyamin Netanyahu, do extremista Likud, se viu obrigado a derreter-se em elogios a Olmert. Além dos seqüestros, Olmert está anunciando seus planos de anexação definitiva do assentamento de Ariel em território palestino, e a construção de um posto de polícia na chamada área E1 (“East 1”) para reforçar a anexação do território que vai de Jerusalém oriental ao assentamento de Ma'ale Adumin. Tudo parte de uma mesma campanha política. Inclusive, a declaração do Hamas de que a invasão de Jericó prova que ele, o campeão das urnas pelo lado palestino, tem razão em não depor as armas.
A outra vez que Ahmad Saadat e os demais membros da FPLP (Frente Popular da Libertação da Palestina) foram os peões emprestados do jogo político de Israel foi em 2001. Para entender a situação, remontamos a 1999. Nesse ano, a FPLP, que sob o seu líder histórico, Georges Habache, tivera um papel importante na oposição à OLP e aos Acordos de Oslo, renunciou à luta armada em um acordo com a OLP. Em 2000, quando estourou a segunda Intifada , a organização manteve-se afastada inicialmente, sem participar da revolta. Mas um ano depois, em agosto de 2001, o chefe da FPLP, Moustafa Al Zibri, alias Abou Ali Moustafa, que acabava de suceder Georges Habache, foi vítima da política de liquidação israelense.
A partir daí, a organização iniciou represálias. Em outubro de 2001, matou Rehavem Zeevi, o ministro do Turismo de Israel de discurso radical e defensor da “transferência” dos palestinos para fora dos Territórios Ocupados de Gaza e Cisjordânia. O novo chefe da FPLP, e representante da sua ala mais radical, Ahmad Saadat foi preso arbitrariamente pela Autoridade Nacional Palestina (ANP) em janeiro de 2002. Junto com os outros quatro membros da FPLP, foram transferidos à prisão de Jericó e colocados sob a proteção do Acordo de Ramallah. O Acordo determinava que a vida dos cinco militantes seria protegida pela presença permanente de guardas, ou monitores, norte-americanos e ingleses. Qualquer alteração no status dos prisioneiros só poderia ser resultado de um comum acordo entre Israel e a ANP.
Em clara violação desse Acordo e, podemos dizer devido ao caráter da operação, de todos os acordos já assinados por Israel, o seu exército invadiu Jericó, matou dois inocentes, feriu 14, impediu o acesso das ambulâncias de socorro, derrubou as paredes da prisão com seus imensos buldozeres blindados; com megafones, ameaçou de morte qualquer um que se interpusesse em seu caminho; e capturou aqueles cinco prisioneiros políticos que em 2001 responderam à política israelense de assassinato selecionado, na mesma moeda, assassinando um dos seus.
Até quando a resistência palestina vai continuar jogando o jogo de Israel? Até quando vão empregar as armas contra a quarta potência militar do planeta? Como bem lembra Amira Hass, Israel joga xadrez, enquanto os palestinos rebatem no pingue-pongue. Se a resistência palestina souber responder da maneira certa à invasão de Jericó, sem recorrer a atentados suicidas ou aos foguetes Quassam, tem em mãos uma excelente oportunidade de desmascarar a política israelense, além da cumplicidade dos Estados Unidos e União Européia, e começar a ditar as regras do jogo.