O ICArabe lança mais um verbete da série especial dedicada a ampliar o conhecimento sobre o mundo árabe. A iniciativa reafirma o compromisso do Instituto com a disseminação de informação qualificada, pautada pela responsabilidade e pelo combate a estereótipos — um passo importante para a construção de uma sociedade mais informada e consciente.
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Intifada
Intifada é uma palavra árabe comumente traduzida como agitação, revolta e insurreição. É também traduzida como “sacudida”. Em geral, a palavra carrega o sentido de libertar-se de algo. No contexto palestino, intifada refere-se aos levantes populares e coletivos contra a ocupação e a colonização israelense-sionista, em especial à Primeira Intifada (1987-1993) e à Segunda Intifada (2000-2005). Em ambas as ocasiões, os movimentos incluíram elementos de mobilização de massas em torno de uma causa comum: a libertação da Palestina.
A Primeira Intifada teve início em dezembro de 1987, após a morte de quatro palestinos em um acidente de trânsito envolvendo um israelense na Faixa de Gaza. O episódio desencadeou uma onda de protestos em Gaza, Cisjordânia e Jerusalém Oriental. O levante surgiu de forma orgânica, com a população palestina recorrendo a greves, boicotes, manifestações e desobediência civil. Mulheres e jovens desempenharam papéis centrais na organização da resistência. Apesar de majoritariamente não armada, a Intifada foi brutalmente reprimida por Israel. Entre 1987 e 1993, mais de 1,1 mil palestinos foram mortos, 175 mil ficaram feridos e cerca de 23 mil foram torturados em prisões israelenses. Para defenderem-se, os manifestantes utilizavam pedras, estilingues e coquetéis molotov, o que levou o levante a ser chamado de Intifada das Pedras. Imagens de jovens enfrentando tanques com pedras tornaram-se ícones da resistência palestina. A Intifada teve grande repercussão internacional, expondo a violência da ocupação israelense e desmentindo a narrativa de que esta era pacífica ou benéfica ao povo palestino. Um de seus resultados foi abrir margem para as negociações entre palestinos e israelenses, que resultaram nos Acordos de Paz de Oslo, em 1993.
Contudo, desde o seu início, os acordos provaram envolver menos a busca pela paz e mais a manutenção e institucionalização internacional da ocupação israelense da Palestina. Longe de garantir a autodeterminação palestina, o período pós-Oslo assistiu à expansão dos assentamentos na Cisjordânia, ao cerco cada vez maior à Faixa de Gaza e ao crescente descontentamento com a Autoridade Palestina, criada pelos próprios acordos. Este descontentamento levou ao início da Segunda Intifada, ou Intifada de Al-Aqsa, em setembro de 2000, após a visita de Ariel Sharon à Esplanada das Mesquitas, em Jerusalém. A visita, acompanhada por centenas de soldados, foi percebida como provocação e desencadeou diversos protestos, os quais foram duramente reprimidos. Mais violenta do que a primeira, a Segunda Intifada envolveu confrontos armados, atentados suicidas reivindicados por grupos como o Hamas, e intensas operações militares israelenses, como a invasão do campo de refugiados de Jenin, na Cisjordânia. O levante estendeu-se até 2005, deixando mais de 4 mil mortos, dos quais cerca de 75% eram palestinos. A Segunda Intifada evidenciou o colapso das promessas de Oslo e aprofundou a crise de legitimidade tanto da ocupação israelense como da liderança política palestina.
De maneira geral, as intifadas representaram momentos decisivos da resistência palestina e ilustram a dinâmica de insurgência e contrainsurgência que marca a realidade dos territórios ocupados e colonizados. Elas são expressões de uma luta contínua contra a colonização e o apartheid, combinando táticas armadas e, majoritariamente, não armadas.
Mini-bio
Isabela Agostinelli é professora de Relações Internacionais na FECAP, pesquisadora do Grupo de Estudos sobre Conflitos Internacionais (GECI) da PUC-SP e do Instituto de Ciência e Tecnologia para Estudos sobre Estados Unidos (INCT-INEU). Realizou Pós-Doutorado (2024) no Programa de Pós-Graduação em Relações Internacionais San Tiago Dantas (UNESP, UNICAMP, PUC-SP), com projeto vinculado ao INCT-INEU. É doutora em Relações Internacionais pelo PPGRI San Tiago Dantas (UNESP, UNICAMP, PUC-SP). Desenvolve pesquisas nas áreas de segurança internacional, colonialismo e pós-colonialismo, Palestina e Israel, com foco na Faixa de Gaza, e sobre a política externa dos Estados Unidos para o Oriente Médio, com foco no Irã.