Brasileiros e libaneses: como começou essa história?
Montado em uma égua branca, que fazia lembrar a figura de um cavaleiro medieval, e acompanhado de uma comitiva de 200 pessoas (entre elas, barões, viscondes, baronesas, damas de honra...), o segundo e último imperador do Brasil resolve, em 1876, realizar um sonho de adolescente: conhecer quatro países do Oriente Médio, entre eles o Líbano. Tinha, então, quase 50 anos de idade e a barba branca que o caracterizou nos livros de história do Brasil que conhecemos hoje.
Foram apenas quatro dias nos país dos cedros, mas Pedro II conseguiu descrever com uma riqueza de detalhes impressionante essa viagem em seu diário particular de bordo, numa linguagem romântica (beirando a melosa), dedicado todo ele a uma mulher, Luiza Margarida Portugal e Barros, a Condessa de Barral, a paixão do imperador, sua melhor amiga, e grande incentivadora, que o acompanhou até seus últimos dias, em Paris, onde faleceu no exílio.
Esse diário com suas impressões, desenhos e anotações pessoais, além de fotos de sua passagem pelo Líbano e outros documentos cedidos pelo Museu Imperial de Petrópolis e pela Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro, está exposto no Sesc São Paulo desde 24 de novembro próximo. Comemora os 135 anos de sua visita àquele país. Quem promove é a Associação Cultural Brasil-Líbano, dirigida por Lody Brais, e contou na solenidade de abertura, com o lançamento feito pelos Correios do carimbo comemorativo alusivo à data (Projeto de Lei 5.740/09, sancionado pelo Senado Federal, que institui 22 de novembro como o Dia da Comunidade Libanesa no Brasil, a pedido da própria associação realizadora dessa mostra).
Na oportunidade, o público terá oportunidade de conhecer em pormenores a rota do imperador pelo Oriente Médio e a da imigração libanesa para o Brasil, elaborada pelo mestre de Relações Internacionais Gustavo Chacra. Para quem não sabe, este é o país
que abriga o maior número de libaneses e descendentes no mundo (estimado em 8 milhões), e essa turma não está aqui por acaso.
Em sua turnê pelo Oriente, o imperador viajava com uma missão em mente: divulgar o Brasil mundo afora, particularmente aos povos árabes, por quem nutria grande admiração. Tornou-se, assim, o primeiro relações públicas de nossa história, vendendo a ideia de um país cheio de oportunidades e atraindo, desse modo, a grande imigração em massa dos povos árabes para cá. Foi o pioneiro nas relações Brasil-mundo árabe.
Dominando a língua árabe e convencendo as pessoas de seu intento, o imperador mudou o destino e a identidade desta nação numa dimensão que nem ele imaginaria à época.
Fato suficiente para se comemorar um evento que já entrou para a agenda de São Paulo, capital cultural da América do Sul. Afinal, quem não tem um amigo descendente direto desses povos? Quem ainda não experimentou a esfirra ou o quibe, que entraram gostosa e definitivamente para o cardápio brasileiro?
No Piauí, alguns libaneses se fixaram em Floriano. E em Teresina, a família Sady, originária de Zahle, do qual faço parte como estatística por parte de avó paterna, destacou-se como uma das grandes empreendedoras do comércio local, com ênfase para a figura de Miguel Sady, o fundador do CrediSady, na Praça Rio Branco, e criador do crediário tal como conhecemos atualmente.
Portanto, quem estiver na terra da garoa, por volta desse período (até 15 de janeiro, veja agenda), terá a excelente oportunidade de conhecer in loco como se deu viagem do imperador pelo Líbano em seus pormenores, além da louca e fascinante saga desses bravos e corajosos imigrantes pioneiros que vieram do outro lado do mundo, arriscando tudo, inclusive a própria vida.
Fica aqui a sugestão para que o Sesc leve essa exposição para Teresina, para deleite de todos os pesquisadores, amigos e descendentes dos povos árabes que por aqui residem.
Marta Tajra é historiadora e jornalista. Edita a revista Imóveis & Negócios no Piauí e coordena o Projeto "Memória do Comércio Piauiense", pela Câmara dos Dirigentes Lojistas de Teresina, cidade onde reside.