Haverá Paz?
Sou judeu. E paulistano. Também sou jornalista com formação em Filosofia. Em agosto de 2000, dois meses antes de explodir a Segunda Intifada, fui morar em Israel para fazer pesquisa acadêmica e trabalhar como jornalista. Já tinha visitado o país algumas vezes, mas a realidade palestina sempre ficara distante. A única vez que cheguei mais perto da vida dos árabes naquela região foi quando trabalhei como voluntário num kibutz (comunidade rural de inspiração socialista) e conheci um árabe de cidadania israelense na linha de produção da fábrica. Tinha 17 anos, ele me convidou para conhecer sua casa, mas não me deixaram ir, alegando algum perigo.
Mas da última vez meu contato com os palestinos foi bem maior. Como jornalista a serviço do 'Globo' e 'Expresso' (Portugal), visitei cidades da Cisjordânia (Ramallah, Belem, Taybeh), dois campos-de-refugiados e Gaza. Entrevistei o comandante da intifada, Marwan Barghouti, o cineasta Mohamad Bakri (autor do censurado 'Jenin, Jenin'), os adolescentes que enfrentam o exército israelense com pedras na mão, palestinos ligados a Fatah e Hamas, entre outros.
Também ouvi os israelenses. Conversei com o escritor Amos Oz, o cineasta Amos Gitai, vítimas de atentados, colonos que vivem nos territórios palestinos, oficiais do exército etc. Uma coletânea das minhas reportagens foi publicada este ano no livro 'Retratos de uma Guerra – Histórias do Conflito entre Israelenses e Palestinos' (Editora Globo).
E então, me perguntam, haverá paz? Difícil dizer. A curto prazo, lógico que não. A situação hoje se assemelha ao cenário logo após uma briga de rua: os dois lados foram separados, mas ainda estão ofegantes, machucados e cheios de ódio. O máximo que pode acontecer numa situação dessas é ambos fazerem pequenos gestos de reconciliação: parar a agressão, balbuciar algumas palavras mais gentis e até arriscar um aperto de mão. Por enquanto será só isto.
E depois? O cenário mais pessimista é nada mudar. A violência continuará, mesmo após a retirada de Gaza. Não será criado um clima para negociações sérias de paz e, em breve, a panela de pressão irá estourar novamente.
Mas há também razões para se apostar num cenário mais otimista. Do lado israelense, Ariel Sharon foi o primeiro líder da direita a definir a presença militar nos territórios palestinos como 'ocupação'. Também o ex-premiê Ehud Barak falou na possibilidade de compartilhar Jerusalém com os árabes, dividindo a Cidade Velha. Do lado palestino, intelectuais como Sari Nusseibeh já disseram que o direito de retorno dos refugiados deverá ser realizado apenas na futura Palestina, e não em território israelense.
São passos aparentemente tímidos, mas sem eles não haverá reconciliação entre os dois povos. Para se chegar à paz, será preciso uma transformação de mentalidade. Temas-tabu como Jerusalém e refugiados terão que ser colocados na mesa e rediscutidos com coragem. Sem isso, não haverá paz.