Luci Mansur lança livro “Solidão-Solitude: passagens femininas do estado civil ao território da alma”

Qui, 16/06/2011 - 20:24
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A partir de pesquisas voltadas aos novos modos de subjetivação femininos, busco compreender fenômenos atuais pouco investigados academicamente, dando voz às mulheres implicadas nesses processos. Como a cidade de São Paulo abriga filhas de imigrantes diversos, na constituição polifônica dessas investigações também contei com significativos relatos de mulheres descendentes de árabes.  

Lançado recentemente pela EDUSP, “Solidão-Solitude: passagens femininas do estado civil ao território da alma” é um trabalho que busca compreender os sentidos sociais e emocionais da experiência feminina de viver só conjugalmente no ocidente contemporâneo, aproximando-se do extenso campo das relações entre homens e mulheres e da complexa constituição do feminino e do masculino, ao longo do tempo. 

Resultado de pesquisa interdisciplinar para doutoramento no IPUSP, esse trabalho oferece o fecundo encontro entre as mulheres entrevistadas e os autores selecionados, contrapondo dialogicamente narrativas pessoais e textos das ciências humanas e sociais. Sob perspectiva teórico-metodológica de inspiração bakhtiniana (ética, estética e epistemológica), promove  a reunião de conhecimentos históricos, demográficos, sociológicos e psicanalíticos com o saber poético. Percorre um caminho singular que se estende da externalidade do mundo para a interioridade da vida emocional, atravessando a superfície de certos registros sócio-históricos até alcançar a profundeza dos domínios da alma.

Nesse estudo, a solidão não se refere apenas à situação objetiva de privação da companhia de alguém, mas ao fato de se sentir solitário, mesmo na presença de outros: uma experiência negativa e angustiante, em que prevalecem sentimentos de vazio, de desespero e abandono, causados pela ausência ou perda da presença simbólica do outro, na interioridade de si.   

Por outro lado, temos a solidão positiva, ou solitude, que expressa a conquista da possibilidade de ficar só de um modo sereno, confiante e criativo. Trata-se de estar sozinho e, paradoxalmente, muito bem acompanhado, porque o outro está sempre presente dentro de si (ainda que ausente concretamente). E essa importante aquisição, segundo hipóteses psicanalíticas, depende da sustentação emocional ofertada ao bebê desde sua chegada ao mundo e também das oportunidades e experiências culturais oferecidas pela família e pela sociedade, ao longo da vida de todo ser humano. 

Podemos, portanto, avaliar a solitude como uma conquista humana. Essa solidão positiva, ficar só e em boa companhia, em suas complexas injunções psíquicas e sociais, embora ainda seja pouco reconhecida e valorizada culturalmente, nos permite concluir que assim como as relações interpessoais, também o silêncio e a quietude se revelam mestres de uma vida plena e criativa, conectada com as profundezas da alma, do corpo e do mundo que nos rodeia.